Recentemente o Governo Federal resolveu flexibilizar as regras do empréstimo consignado no Brasil por conta da pandemia do coronavírus . Se por um lado, a ideia básica é ajudar os aposentados a terem crédito e, por contrapartida colocando mais dinheiro no mercado, por outro, agravou uma situação que já se demonstrava extremamente preocupante por conta do endividamento desse segmento.
O que é um empréstimo consignado?
É uma modalidade de empréstimo que se caracteriza pela forma compulsória de seu pagamento, ou seja, o contrato de empréstimo é feito com a garantia do desconto no contracheque do aposentado, feito pelo próprio INSS. Ele já recebe a sua aposentadoria com a parcela descontada.
A principal mudança ocorridas desde março deste ano, foi na taxa de juros, prazo de pagamento e na margem consignável.
Vejamos abaixo como era antes e como é agora:
Antes: Depois:
Taxa média de juros: 2,08%………………………………………………1,8%
Prazo Máximo 72 meses.…………………………………………………..84 meses.
Margem: 30% empréstimo normal…………………………………….35%
35% Cartão de Crédito Consignado…………………..40%
5% taxa de administração da operadora nos dois casos.
As taxas do empréstimo baixaram e o tempo de pagamento aumentou. Além disso, a margem do que era consignável deve aumentar de 30% (trinta por cento) para até no máximo 40% (quarenta por cento) do valor que o aposentado recebe do seu benefício. Atualmente, a diminuição das taxas e alongamento do prazo já foram aprovadas pelo Governo Federal. A alteração da margem consignável é que está aguardando lei própria para ser aprovada, mas é só questão de tempo. Os riscos deste tipo de empréstimo são extremamente altos e podem levar o aposentado a um endividamento desnecessário.
Por conta da autorização dessa modalidade de empréstimo, os aposentados se tornaram alvos preferenciais de bancos e financeiras. Eles são constantemente assediados por entidades financeiras que se utilizam de telemarketing, correspondências e atendimento nas agências de pagamento do benefício, para tentar convencer o aposentado a realizar o empréstimo.
Há um grande mistério na forma através da qual essas entidades, conseguem informações cadastrais dos aposentados para contatá-los . O contato chega a possuir detalhes impressionantes, pois muitas vezes o captador comercial dessas entidades, apresenta ao aposentado dados tais como o número de seu benefício, o valor recebido e a data de concessão da aposentadoria, isso sem falar no endereço residencial do mesmo.
A forma de obtenção dos dados a meu ver, possui indícios de ilicitude, pois são dados sigilosos que somente o INSS possui e não tem permissão legal para repassá-los a entidades privadas.
Existe um grande número de aposentados que tem dificuldades, ou por conta da tecnologia que a cada dia mais avança de forma impiedosa, ou por conta de problemas normais da própria velhice. Por essas razões, o entendimento do aposentado sobre o que está contratando, fica por vezes prejudicado.
É sempre colocado a esse público alvo, que existe um valor a sua disposição de fácil acesso, que pode ser retirado a qualquer tempo, estando seu crédito pré-aprovado e por isso mesmo, não existindo grande burocracia para a sua contratação.
A situação fica ainda pior, quando o aposentado vai até a sua agência pagadora e é atendido por atendentes extremamente atenciosos, treinados para isso. Eles oferecem a contratação e acompanham os aposentados até o caixa eletrônico para os induzir a realizar tal operação. Isso também acontece nos caixas físicos, onde o funcionário que atende o aposentado tentar lhe vender o produto a todo custo. A própria entidade financeira incentiva os seus funcionários para tanto lhes oferecendo comissões pelas contratações.
A contratação é extremamente simples, podendo ser feita tanto no caixa eletrônico, físico ou pela internet. Pela facilidade o aposentado contrata sem nem mesmo precisar realmente do dinheiro naquele momento, se esquecendo que o valor na verdade é do agente financeiro. O aposentando recebe um resumo do contrato com informações extremamente básicas que não demonstram de forma clara todas as condições e cláusulas que envolvem aquela contratação.
Essa facilidade na contratação, infelizmente também beneficia familiares e vizinhos inescrupulosos que abusam da confiança do aposentado, conseguindo ter acesso ao cartão de benefício e a sua senha. Com isso consegue em qualquer caixa eletrônico do banco pagador do benefício, contratar um empréstimo consignado e sacar o valor integral na hora. O aposentado, muitas vezes, só fica sabendo do acontecido, tempos depois, quando percebe que sua renda está caindo inexplicavelmente.
O fruto das várias situações acima citadas é que alguns aposentados não conseguem viver com o restante do que recebe da sua aposentadoria. Dessa forma procuram novamente o agente financeiro para uma renegociação e entram em nova arapuca, pois aumenta o prazo de pagamento, fazem uma nova contratação e aumenta o valor devido.
Só para termos ideia da situação, as entidades financeiras trabalham em situações de contratação normal ou de renegociação, com o CET (Custo Efetivo Total) que varia de uma para outra. Fazem parte do CET, taxas de cadastro, IOF e outras taxas de administração diversas. Quando o aposentado contrata um empréstimo consignado não está apenas contratando o valor mensal, mas também a totalidade do CET de cada agente financeiro. Desta forma o valor contratado pode ser ainda mais alto.
Como se defender deste tipo de empréstimo?
A forma mais simples é proteger seus entes queridos desse assédio indiscriminado. Ficar sempre atento às cartas de oferecimento de empréstimo e ligações telefônicas constantes . Outra forma interessante é acompanhar o aposentado ao banco para evitar o assédio nas agências também.Pode-se ainda, se for o caso, denunciar nos órgãos competentes o assédio que ocorre por telefone e cartas, nos órgãos de controle e de proteção, como por exemplo a Anatel, Delegacia de Idosos, Ministério Público, Procon e Juizados Especiais.
Por fim, se houve a contratação e ela estiver sendo prejudicial ao aposentado, o melhor caminho é o judicial, através de ações revisionais contratuais ou até mesmo anulatórias, dependendo do caso. Tais medidas judiciais existem para se verificar a margem usada no empréstimo, a forma da contratação e as taxas adicionais cobradas.
Qual seria a melhor forma de utilização desta modalidade de empréstimo?
Da forma como se encontra não existe segurança para quem contrata. Para se evitar os problemas acima mencionados, o legislador deveria rever a norma legal vigente que autoriza tais contratos.
Tais mudanças poderiam ser as seguintes:
– O empréstimo deveria ser feito de forma física e não virtual ou eletrônica.
– Deveria ser feito com o gerente da conta, acompanhado de pelo menos uma testemunha, para que o aposentado tenha maior entendimento do que está contratando e para também evitar que terceiros façam alguma contratação sem a sua autorização.
-O aposentado deveria no ato da contratação, levar uma cópia completa do contrato feito, acompanhado de uma simulação que demonstre como seria o prazo, as parcelas e o valor ao final pago.
– Por fim a margem de consignação deveria ser mais baixa. Especialistas dizem que deveria ser de no máximo 10% (dez por cento).
O acesso ao crédito não deve ser cerceado, mas os segmentos a ele direcionados devem ser melhor analisados, levando em conta a sua segurança e a fragilidade dos envolvidos, como no caso dos aposentados.