O descumprimento contratual por caso fortuito ou força maior nos tempos do coronavírus

O Advogado  Cláudio Silveira  esclarece o que significa caso fortuito  e o motivo de força maior , nos casos de descumprimento contratual por conta da Pandemia.

Como já sabido no meio jurídico, o contrato faz lei entre as partes. É um dos pilares do direito, entretanto, existem situações que impedem o seu cumprimento, tanto pelo contratado como pelo contratante. Como se dá com o caso fortuito ou motivo de força maior. O Código Civil Brasileiro em seu art. 393 preconiza tal hipótese, vejamos:

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

 Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.”

O texto legal é claro quando diz que o fato fortuito ou de força maior é aquele que não era possível evitar ou impedir. Entretanto, qual é a diferença entre os dois?

O caso fortuito é aquele evento cuja ocorrência, não possui previsão e assim suas consequências não podem ser impedidas. Um bom exemplo é um naufrágio, a queda de um avião, um meteoro e assim vai.  Já com relação a ocorrência de força maior, ela se caracteriza por eventos ocasionados por pessoas ou por origem natural. Tais ocorrências, em algumas circunstâncias, podem ser previstas, mas que infelizmente, não podem ser impedidas. Exemplo disso são conturbações sociais, como greves ou guerras, ou eventos naturais como furacões ou ciclones.

A situação causada pela pandemia do COVID-19 é fato de conhecimento público e notório, cuja abrangência é mundial. Tal ocorrência foge ao controle tanto das autoridades, quanto da pessoa comum. Suas consequências são imprevisíveis nas esferas sanitária e econômica. Por essa razão, sua ocorrência pode fortemente ser enquadrada na caracterização de caso fortuito.

Mesmo com um olhar mais crítico, se a parte contrária alegasse que houve outras situações endêmicas com vírus semelhantes à Covid-19, do tipo H1N1, gripe Aviaria, justificando tratar-se de uma questão de tempo a possibilidade de nova ocorrência, ainda assim poderia se alegar o motivo de força maior.

Como culpar uma empresa que não entrega seus produtos porque seus empregados da linha de produção estão em casa em quarentena por causa da pandemia? Como honrar contratos de empréstimo, locação ou mesmo de produção, se a cadeia produtiva e negocial está totalmente comprometida, por conta de uma emergência sanitária que parou praticamente o mundo inteiro? Os reflexos dessa situação vão se fazer sentir por muito tempo após o fim da pandemia, quando serão contabilizados os prejuízos causados pelos descumprimentos de contratos nas mais diversas áreas.

É nesse momento, que as partes contratualmente envolvidas deverão ter o bom senso de renegociar prazos e pagamentos pactuados anteriormente à pandemia. Aqueles que se sentirem prejudicados e não optarem pela linha da negociação, recorrendo diretamente ao judiciário por descumprimento contratual, correrão grave risco de perderem tempo e dinheiro, por existir previsão legal para tais situações.

Assim, as partes contratadas estarão em  via de mão dupla, pois tanto quem não teve cumprimento de seu contrato pode recorrer ao judiciário para exigir cumprimento e eventuais compensações, como quem não cumpriu, por questão de força maior ou caso fortuito, também poderá fazê-lo para se resguardar das cláusulas de descumprimento com previsão de multa.

O próprio Governo Federal tem editado medidas provisórias  para tentar resguardar o equilíbrio dos contratos realizados, como por exemplo a Medida Provisória 925/2020,  que garante às companhias aéreas, a opção de reembolsarem, em até 12 meses, os consumidores que compraram passagens aéreas antes da pandemia e cujos os voos foram cancelados. Tal providência evita que haja um enriquecimento ilícito da empresa, protegendo assim o consumidor e ao mesmo tempo garantindo a fluidez de caixa da empresa aérea.

No entanto é importante dizer que o princípio da ocorrência tanto do caso fortuito como da chamada força maior, não podem ser usados como um remédio milagroso para todas as situações. Tanto a pessoa física como a jurídica, que se encontrava em inadimplência ou mesmo em descumprimento contratual antes da ocorrência da pandemia, não pode se utilizar de seus efeitos para justificar a ocorrência do descumprimento do contrato.

Existe também outra exceção, quando no contrato pactuado entre as partes, houver cláusula na qual as partes concordem que a ocorrência de força maior ou caso fortuito não seria justificativa para o descumprimento das obrigações pactuadas. Como dissemos antes, “o contrato faz lei entre as partes”.

Finalizando, é importante lembrar que no caso de ser acionada a justiça para se discutir o descumprimento contratual ocorrido durante o presente período, deve-se ter a ciência de que não basta ao interessado alegar a ocorrência de fato fortuito ou força maior em sua defesa, ele deve comprovar de forma cabal, que a ocorrência da pandemia realmente afetou o cumprimento da obrigação contratual.

O bom senso ainda é o melhor caminho para que as divergências sejam resolvidas amigavelmente e assim consequentemente os prejuízos serão minimizados.

crédito de imagem-https://www.pexels.com/pt-br/foto/alvorecer-amanhecer-amarelo-ao-ar-livre-1119974/

Escrito por: Cláudio Luiz Marques Silveira

Advogado graduado pela UFMG em 1994,especialista em Posse e Propriedade. Militante a 25 anos na área de direito bancário, indenizatório, direito do consumidor e empresarial.

Leia também…