Ampliação da prescrição por crime de abuso infantil
O abuso infantil é uma realidade de repercussão mundial. Recentemente, uma pesquisa das Nações Unidas do Brasil (ONU) dá conta que a cada ano metade das crianças do mundo, isto é, aproximadamente 1 bilhão, são afetadas por alguma forma de violência, seja ela física, sexual ou psicológica.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº. 8.069/1990), apelidado de ECA, é o diploma legal responsável pela proteção de todos os direitos das crianças e adolescentes no Brasil. Seguindo a Constituição de 1988, ele estabelece que é dever da família, da sociedade e do Estado, conferir proteção a toda criança e adolescente, colocando-os a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Outro instrumento legal de grande importância é a Lei Joanna Maranhão (Lei nº. 12.650/2012), que altera o art. 111, do Código Penal, que trata da prescrição abstrata, ou seja, da prescrição antes do trânsito em julgado da sentença final.
Vale dizer que essa lei surgiu a partir de Joanna Maranhão, uma nadadora brasileira, que foi abusada quando criança por seu treinador. Ela externalizou o abuso já na fase adulta, tendo o crime prescrevido, impedindo a responsabilização do agressor.
Para ficar mais fácil a compreensão, prescrição é o tempo que o Estado tem para tomar conhecimento do crime, investigar, processar e julgar. No caso, a prescrição abstrata é calculada de acordo com a pena máxima aplicada em cada crime, seguindo as diretrizes instituídas pelo art. 109, do Código Penal. Confira:
PRESCRIÇÃO ABSTRATA |
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SE A PENA DO CRIME FOR | PRESCREVE EM |
Maior que 12 anos | 20 anos |
Maior que 8 e até 12 anos | 16 anos |
Maior que 4 e até 8 anos | 12 anos |
Maior que 2 e até 4 anos | 8 anos |
Igual a 1 e até 2 anos | 4 anos |
Menor que 1 ano | 3 anos |
Como marco inicial para contagem desse prazo prescricional geralmente temos a data de consumação do crime. Ocorre que a Lei Joanna Maranhão determina que quando o crime é praticado contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes, o prazo prescricional será iniciado da data em que a vítima completar 18 (dezoito) anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal.
Isto quer dizer que a Lei Joanna Maranhão amplia o prazo da prescrição, tendo o Estado maior tempo para tomar conhecimento do crime, investigar, processar e julgar. Vou dar um exemplo: a pena do crime de estupro é de reclusão, de 6 a 10 anos. Esse crime prescreve em 16 anos, de acordo com a nossa tabelinha acima. Certo!
Todavia, quanto o crime for praticado contra criança e adolescente, ele prescreverá em 34 anos, pois o marco inicial para contagem é quando a vítima completar 18 anos de idade e não a data de consumação do crime.
Esse prazo prescricional ampliado permite que a vítima se desenvolva, adquirindo o amadurecimento e o discernimento necessário para compreender a violência que sofreu e, assim, promover a denúncia do abuso.