Você Sabe o que é o teletrabalho?

Teletrabalho

  1. Etimologia, histórico, conceito e modalidades

Em sua etimologia, a palavra teletrabalho é formada pelo prefixo tele – do grego –, que significa longe de, à distância, e pelo substantivo trabalho, de origem latina, tripalium, conhecido como um instrumento formado por três estacas de madeira afiadas, utilizado para torturar animais e escravos. É no século XIV que o trabalho abandona o significado de sentir dor ou sofrer para assumir o caráter de atividade humana conduzida para um determinado fim.

O teletrabalho – teletrabajo, telearbeit, telelavoro ou teletravail – possui nos diversos países o sentido de trabalho exercido a distância. Ao revés, observa-se que nem todo trabalho a distância significa teletrabalho, como é o caso do trabalho em domicílio, nem sempre incluído no conceito por ausência de elementos ínsitos à relação de teletrabalho, como o uso de tecnologia. É de se ver que uma costureira ou um artesão que laboram no próprio domicílio não serão considerados teletrabalhadores, se não preenchidos os requisitos.

Preocupado com os rumos da tecnologia e sua aplicabilidade na vida real, o americano Jack Nilles – físico e projetor de numerosos veículos espaciais –, na década de 1970, ao realizar assessoramento ao novo diretor da Nasa, propôs diversas ideias concernentes a satélites de comunicação. A utilização de mensagens via satélite na ocasião era marcada pela impossibilidade de enviar médicos à África em tempo hábil. Informações médicas a distância, substituíam a presença física de profissionais da medicina, como forma de conter a alarmante situação clínica da região, agredida pela fome[1].

Se desde a Revolução Industrial nos países em processo de industrialização, consoante aponta Jack Nilles[2], a tendência era a centralização dos locais de trabalho, em contrapartida, o teletrabalho é descentralizado, conceituado como levar o trabalho aos trabalhadores, em vez de levar esses ao trabalho; atividade periódica fora do escritório central, um ou mais dias por semana, seja em casa ou em um centro de telesserviço”[3].

O autor, outrossim, conceitua telesserviço[4] como “qualquer alternativa para substituir as viagens ao trabalho por tecnologias de informação (como telecomunições e computadores).

Já o professor Manuel Martin Pino Estrada apresenta dois conceitos de teletrabalho. No primeiro, o trabalho remoto “é aquele realizado com ou sem subordinação através do uso de antigas e novas formas de telecomunicação em virtude de uma relação de trabalho, permitindo a sua execução à distância, prescindindo da presença física do trabalhador em lugar específico de trabalho”[5].

Com relação as modalidades, uma das principais é teletrabalho em domicílio, que se realiza no domicílio ou ambiente familiar do teletrabalhador. Organiza-se um escritório – também conhecido por home office (escritório em casa) ou home work (trabalho em casa) – onde serão instalados todos os equipamentos necessários ao desempenho das atividades.

Há ainda o teletrabalho nômade configura essencialmente a ausência de local determinado para a execução das tarefas desempenhadas pelo teletrabalhador. Contudo, o referido local, pela natureza do teletrabalho, será qualquer lugar, desde que não seja o domicílio ou ambiente familiar nem as dependências do estabelecimento empresarial.

O telecentro é todo e qualquer lugar que se destina à realização de trabalho fora do estabelecimento empresarial, quando não configure domicílio ou ambiente familiar do trabalhador. É uma extensão da sede empresarial, todavia, não é uma filial, pois a sua finalidade é apenas servir de base para a execução do teletrabalho, sem as demais estruturas que compõem uma filial empresarial. O teletrabalho em telecottages incide na zona rural ou regiões de baixa escolaridade e trabalho precário. É em razão de sua localização que este se diferencia dos telecentros.

Por fim, o trabalho transfronteiriço, segundo Manuel Martín Pino Estrada, é “aquela situação onde um trabalhador que tem seu domicílio e trabalha em um determinado país, o faz para uma empresa localizada noutro”[6]. Em virtude das técnicas de informática e telecomunicações, pode ser ainda transregional, transnacional e transcontinental.

  1. Teletrabalho em tempos de Pandemia

A regulamentação do teletrabalho no Brasil ocorreu a partir da conhecida Reforma Trabalhista – Lei 13.467/2017, que abordou o tema entre os artigos 75-A a 75-E da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

O que podemos observar é que com advento da pandemia que se alastrou também em nosso país, por meio do novo Coronavírus – COVID-19, o teletrabalho se tornou alternativa para que empregadores e trabalhadores continuassem com suas atividades, primando pela manutenção do trabalho/emprego e fornecimento de bens e serviços. Após esse cenário se concretizar com o isolamento social, medidas provisórias igualmente foram editadas para regular as relações de trabalho em situação de calamidade, a exemplo da MP 927/2020, que trouxe um capítulo específico para o teletrabalho.

As consequências serão desnudadas num futuro próximo. É evidente que o teletrabalho deve ser visto como uma modalidade de trabalho que impede o desemprego de milhares de trabalhadores durante o isolamento social. Será possível também observar que o teletrabalho bem realizado e equilibrado poderá futuramente alterar centenas de postos de trabalho antes realizados na sede empresarial.

Todavia, já é possível observar diversos trabalhadores exaustos física e mentalmente, impossibilitados de ter uma contraprestação pecuniária em caso de labor em horas extras (impeditivo expresso na CLT no art. 62, III, que exclui o teletrabalho do capítulo de jornada), e, sem cursos para se adaptarem às novas tecnologias ou recebimento dos meios de trabalho pelo empregador (internet, aparelhos tecnológicos, cadeira ergonométrica, entre outros).

Precisamos estar atentos para que os custos do empreendimento não sejam transferidos ao trabalhador, bem como a adoção de cursos paralelos às esses teletrabalhos já em curso, para que o isolamento social e a demanda de trabalho não se tornem um meio de adoecer os trabalhadores física e mentalmente, que se submetem a jornadas exaustivas e a metas de produtividades impossíveis em troca do seu pão de cada dia.

[1] NILLES, Jack M. Fazendo do teletrabalho uma realidade: uma guia para telegerentes e teletrabalhadores. São Paulo: Futura, 1997. p. 9.

[2] No original: Telework: ANY form of substitution of information technologies (telecommunications and computers) for work-related travel. Telecommuting: that portion of teleworking that applies to the daily commute to and from work-a primary source of traffic congestion, air pollution and loss of productivity in urban areas”.

[3] NILLES, Jack M. Fazendo do teletrabalho uma realidade: uma guia para telegerentes e teletrabalhadores. São Paulo: Futura, 1997. p. 15.

[4] NILLES, Jack M. Fazendo do teletrabalho uma realidade: uma guia para telegerentes e teletrabalhadores. São Paulo: Futura, 1997. p. 15.

[5] ESTRADA, Manuel Martín Pino. Teletrabalho & Direito: o trabalho à distância e sua análise jurídica em face aos avanços tecnológicos. Curitiba: Juruá, 2014. p. 15.

[6] ESTRADA, Manuel Martín Pino. O trabalho transfronteiriço no direito brasileiro. Revista Consultor Jurídico, 30 dez. 2002. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2002-dez-30/teletrabalho_transfronteirico_direito_brasileiro?pagina=3>. Acesso em: 10 jun. 2017.

Escrito por: Talita Camila Gonçalves Nunes

Doutora e Mestre em Direito pela UFMG. Doutorado Sanduíche Harvard Law School. Pós-graduada em Direitos Humanos (CEI). Advogada Trabalhista. Professora.

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