A realidade da pobreza no Brasil: o debate que realmente importa.

Enquanto as eleições caminham novamente para discussões pueris, os temas mais relevantes do Brasil são pomposamente esquecidos.

A eleição deste ano vai de vento em poupa! Os grupos de whatsapp da família estão repletos de fake news para animar os dias da galera e o seu tio sabido está interessadíssimo em te ensinar política internacional, macroeconomia, direito constitucional e processo legislativo em um tratado de 500 caracteres. É a festa da democracia tupiniquim!

O problema é que enquanto a gente se diverte no grupo da família, o Brasil agoniza e esse tema aparentemente também está incluído naquele quadradinho do que não importa.

E meu dileto bolsonarista, antes de você vir bradar comigo a prodigiosa frase “mas e o pt ?”, eu já me adianto: nosso problema não é de agora. Não sou membro do “partido futebol clube” ao ponto de ainda ter a ingenuidade de que a “culpa” da nossa realidade é de um partido, de uma pessoa ou de um período na História.

Quem já passou pelo exercício de estudar a História do Brasil com um pouco mais interesse ou prestou atenção nas aulas de História sensacionais, que teve no ensino fundamental (eu tive pelo menos! Mérito do Prof. Ronaldo e da Prof. Mercês), sabe que o nosso problema começou em 1494 quando assinaram o Tratado de Tordesilhas. A coisa só foi aprimorando de lá para cá.

Bom… feito esse necessário recorte para viabilizar que mais gente continue lendo o texto sem me adjetivar negativamente ou atribuir caracteres socialmente depreciativos à minha ascendente, podemos falar do que importa.

A gente é pobre!

Pipocaram uma série de notícias dizendo que a população empobreceu. Isso é verdade! Só que esse não é o maior problema. O maior é que sempre fomos muito pobres e, empobrecer quem já é pobre que é o desastre.

A última pesquisa do IBGE/2021 dá conta de que a renda média do brasileiro é de mais ou menos R$ 2.500,00. Sabe como é que faz esse cálculo né? Bom, se você gostava das aulas de História como eu, provavelmente não era muito dado às aulas de matemática…, mas vamos lá… pega a renda de todo mundo e soma. Com isso tudo somado, divide pelo número de lutadores no ringue e eis a mágica!

Um exemplo prático para eu te mostrar que isso é uma enganação (eu preciso desenhar para mim, ok? Não estou questionando a sua capacidade de abstrair e fazer contas); na ‘exemplolândia’  , temos 10 habitantes. Um habitante tem renda de R$ 100.000,00 por mês; Outros 2 habitantes têm renda de R$ 5.000,00 por mês. Cinco habitantes têm renda de R$ 500,00 por mês. Dois habitantes têm renda de R$ 50,00 por mês. Qual a renda média de ‘exemplolândia’?

Pode confessar que você acionou a calculadora do celular… tudo bem. Eu também fiz isso. Deu R$ 11.260,00 por mês! Fala que não é uma sociedade maravilhosa!

Sacou onde está a pegadinha? O primeiro habitante tem uma renda alta demais e ele distorce o dado, pois puxa a média para cima, ainda que tenha muita gente na parte de baixo da tabela. Ou seja, essa média, na prática, só contempla (e de forma distorcida!) o único habitante que está no topo da pirâmide.

Em terras tupiniquins o raciocínio é o mesmo. Somos um país extremamente desigual. Isso significa que tem um número muito pequeno de pessoas que têm uma renda surrealmente alta e uma massa enorme de gente que tem uma renda muito pequena. Logo, essa média de R$ 2.500,00 por mês não contempla quase ninguém!

Quer a prova? Com R$ 3.500,00 por mês (equivalente ao auxílio moradia de magistrados e membros do MP), uma família já está entre os 10% mais ricos do país! Superou os R$ 10.000,00 de renda familiar, já entrou nos 5% mais ricos! Ou seja, somos tão pobres que demanda relativamente pouco dinheiro para ser economicamente ricos! Na prática, tem muita gente (muita!!!!) que vive com menos de R$ 500,00 por mês. Só que esse dado é mais difícil de aparecer na média.

E de quem é a culpa disso? Bom, se entrarmos nesta discussão, a melhor hipótese é vestir a camisa do partido futebol clube e voltar para o grupo da família. Não tem um culpado! É um problema estrutural de quem não gera renda para a população mais pobre. O resultado dessa distorção é que, em números brutos, somos a 12ª economia do país (esse número aí é para a galera do partido do governo futebol clube usar!), mas em termos de renda, temos renda média equiparável ao Gabão (esse número aí é para a galera do partido oposição clube usar!). Conhece o Gabão meu consagrado??? É uma ditadura em que um tiozinho muito doido manda em tudo e em todos com índices indizíveis de corrupção e pobreza. É nesse degrau que estamos….

Se a intenção não é levar a questão para o grupo da família e espalhar que algum demônio político está tentando acabar com o país, dá para pensar que temos alguns problemas crônicos que precisam de mudanças que vão além da grita. A primeira delas é reconhecer a nossa condição miserável. Isso já ajudaria bastante…

Além disso, seria bem interessante começar a perceber que desigualdade é um problema econômico grave e que medidas de redução desta distorção são importantes. Agora, por favor galera da oposição futebol clube, essa ideia de tirar dos ricos e dar aos pobres é inexequível. É bonito no discurso, só não funciona. Ou você conhece algum país em que todo mundo ganha R$ 2.500,00 igual…???

Então quem sabe olhar para países que passaram por isso para pensar em coisas mais pragmáticas? Do tipo: gerar mais renda para quem é pobre, reduzir o custo de vida e criar bolsões de segurança alimentar e de saúde. Daí em diante as pessoas tendem a caminhar com as próprias pernas, cada uma ao seu tempo.

O problema é que enquanto tivermos uma massa populacional que precisa lutar diariamente para descobrir se tem comida na janta, não sairemos desse lugar. E isso independentemente de qual clube de futebol político tiver levado a partida.

Escrito por: Hudson Cambraia

Formado em Direito há 13 anos, é mestre em Direito Público e pós-graduado em ciências criminais, há muitos anos atuante em gestão pública e administrativa. Possui ainda formação em Privacidade de Dados e Sistemas de Segurança da Informação pela Privacy Academy/IBM (2019), certificação internacional em Segurança da Informação e Proteção de Dados pela EXIN (2019). Possui larga experiência em Direito Público, Constitucional, Administrativo, Processo Legislativo, Controle de Constitucionalidade e Orçamento Público. Foi professor universitário e membro de grupos de pesquisa e estudos nas áreas de Direito Penal, Direito Processual Penal, Direito Constitucional, Direito Econômico e Ensino Jurídico.

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