A prisão do Deputado Daniel Silveira: entenda o que está em jogo

  • Por que Daniel Silveira foi preso?

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O deputado Daniel Silveira é investigado no inquérito que apura ameaças de Fake News contra o Supremo Tribunal Federal. O deputado fez ameaças físicas contra os ministros do STF e exigiu a imediata destituição da Corte. O Ministro do STF escreveu que: “As condutas criminosas do parlamentar configuram flagrante delito, pois na verifica-se, de maneira clara e evidente, a perpetuação dos delitos acima mencionados, uma vez que o referido vídeo permanece acessível a todos os usuários da rede mundial de computadores, sendo que até o momento, apenas em um canal que fora disponibilizado, o vídeo já conta com mais de 55 mil acessos”.  Segundo Moraes o parlamentar propagou a adoção de medidas antidemocráticas contra o STF.

  • Qual o fundamento para a prisão?

Segundo o Ministro Alexandre de Moraes  a conduta do Deputado desrespeitou as seguintes normas  Constitucionais: propagação de ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado Democrático (artigos 5º, XLIV; 34, III e IV); manifestações visando o rompimento do Estado de Direito, com a extinção das cláusulas pétreas constitucionais – Separação de Poderes (CF, artigo 60, §4º) e instalação do arbítrio; crime contra a honra do Poder Judiciário e dos ministros do Supremo, com condutas previstas na Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/73), artigos 17, 18, 22, incisos I e IV, 23, incisos I, II e IV e 26.

  • Divergências sobre a legalidade da prisão de Daniel da Silveira.

Alexandre de Moraes justifica a prisão com o seguinte argumento. “Considera-se em flagrante delito aquele que está cometendo a ação penal, ou ainda acabou de cometê-la. Na presente hipótese, verifica-se que o parlamentar Daniel Silveira, ao postar e permitir a divulgação do referido vídeo, que repiso, permanece disponível nas redes sociais, encontra-se em infração permanente e consequentemente em flagrante delito, o que permite a consumação de sua prisão em flagrante”. Também considerou o crime inafiançável, de acordo com Código de Processo Penal, segundo o qual não se concederá fiança “quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva”

Em nota a defesa alega que: “Os fatos que embasaram a prisão decretada sequer configuram crime, uma vez que acobertados pela inviolabilidade de palavras, opiniões e votos que a Constituição garante aos Deputados Federais e Senadores”. Diante dos fatos surgem várias indagações: houve violação a imunidade parlamentar?! Poderia ser cumprida a noite a ordem de prisão?! Houve vícios processuais?!

  • Lançando luz sobre o tema.

Um Deputado Federal pode ser preso? O artigo 53 da Constituição Federal de 1988 traz a seguinte previsão: os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. Contudo, importante salientar que a imunidade colocada acima só se verifica quando o parlamentar estiver no exercício de suas funções. Não importa onde o parlamentar esteja, se ele estiver emitindo sua opinião em ligação direta com o mandato sua imunidade o protegerá.  Neste sentido, o direito de opinião, inclusive de criticar o STF estaria protegido. Mas um questionamento nos vem a mente: há limite para o conteúdo que se expressa em uma opinião. Sendo mais simplista: posso falar o que eu quiser? Mesmo que o conteúdo do que é dito seja considerado crime?

Bem, há divergências entre vários juristas sobre a possibilidade da prisão ou não, mas uma certa convergência no sentido de que a fala de incitação à violência contra o STF é reprovável. Na verdade, a doutrina constitucional é muito clara de que nenhum direito é absoluto, ou seja, até mesmo o direito à vida comporta exceções – como é o caso do aborto legal, por exemplo. No caso do Deputado Silveira nos parece razoável entender que a fala excedeu à proteção parlamentar. Não se trata de crítica a uma decisão ou a postura do STF, situação perfeitamente normal para instituições em uma democracia, mas sim a incitação à violência físicas contra os membros e à própria existência da Corte.

Quanto à prisão em si, parece que a divergência é ainda mais clara. A constituição apregoa que para que um deputado seja preso são necessárias duas situações: a) o crime cometido deve ser inafiançável e b) a prisão deve ser em flagrante.

O flagrante para efeitos da prisão do deputado, segundo entendimento de Moraes, se concretizou com a disponibilidade dos vídeos no Youtube.  Assim, não se analisa apenas o momento da postagem, mas sim a disponibilidade do vídeo pelo tempo em que estiver na internet.

Este posicionamento representa uma novidade na jurisprudência da corte, e trouxe estranheza para comunidade jurídica. Na verdade, apesar das resistências de alguns juristas, as novas dinâmicas geradas pelas mídias sustentam o raciocínio do Ministro Moraes.

Outra questão é se o crime é afiançável. O Ministro Moraes entendeu que o crime é inafiançável porque nele caberia prisão preventiva. Os crimes inafiançáveis estão previstos na constituição e são considerados inafiançáveis os crimes hediondos especificados em lei. Ora, talvez a interpretação de Moraes tenha alargado o conceito de inafiançável para além do que a própria Constituição quis fazer. Neste ponto, é possível conjecturar que o Ministro possa ter se equivocado em sua interpretação constitucional.

Em síntese, podemos dizer que vivemos tempos de grande polarização política que, somado à nova arena de discussão política colocadas pelas mídias sociais tornou tudo muito complexo. Um dos maiores temores que devemos ter é a deterioração do ambiente democrático. É inegável o efeito maléfico das Fake News e da polarização da sociedade. Na questão da prisão do deputado, torna-se se nítido o choque entre a liberdade de expressão e a proteção do próprio sistema democrático, que estaria sendo afetado pela crítica ilegítima e que não pode ser tolerada. No momento o que devemos ter é o bom senso e confiança nas instituições para que possam decidir da melhor forma diante da tênue linha entre o legal e o ilegal em uma sociedade dividida.

Escrito por: Vinícius Ayala

Advogado graduado em 2005 pelo Centro Universitário Newton Paiva, Mestrado em 2008 – Ciência Política e Relações Internacionais pela Universidad Autonoma de Madrid. Pesquisador visitante na Universidade de Lisboa. Professor Universitário com passagens pela PUC /MG, FAMIG, FAMINAS-BH, UNIPAC, entre outras. Coordenou os cursos de Direito da FAMINAS_BH e FACEMG. Diretor Administrativo da UNIPAC-Nova Lima. Advogado militante com atuação na área de direito constitucional, direito administrativo e direito eleitoral. Mediador Judicial credenciado pelo CNJ e membro do CRCC-Centro de Resolução Consensual de Conflito

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